Tuesday, October 08, 2013

A morte, o corpo e o homem



Todo corpo real deve ter extensão em quatro direções: deve ter Comprimento, Largura, Espessura e – Duração. Mas por causa de uma enfermidade natural da carne... Somos propensos a não notar esse fato.
  
H.G. wells

A morte é o colapso da personalidade humana a partir do perecimento do corpo e seus vínculos (objetos). Ao mesmo tempo, é a eliminação da autonomia frente à entropia universal - abertura à entropia -, a partir de um choque com condicionantes naturais.

Autonomia ---à Choque/morte --à Entropia[1]

Primeiramente, o corpo parece figurar como elemento central que agrega todos os objetos da personalidade, inclusive os objetos simbólicos, os jeitos, as posturas, a entonação, a fleuma e todo o temperamento, além de vincular a si próprio ferramentas como roupas, adereços e outras posses que constituem o edifício da individualização. Em um segundo momento, somos obrigados a relativizar este entendimento, percebendo que o corpo, por mais que seja o ligame dos objetos da personalidade, é ele mesmo mais um objeto perecível. Como consequência, a cultura humana busca, muitas vezes, deslocar a personalidade para fora desta figura, principalmente visualizando o duplo espiritual ou valorizando o legado na forma de registros (fotos, documentos  e outros objetos de culto memorial).

A religião[2] - que tem autoridade para separar mortos e vivos, principalmente através dos ritos funerários -, ao mesmo tempo que afirma a sobrevivência da personalidade sem corpo, a alma sem corpo, como uma condição especial, uma vida em paralelo, demonstra que o corpo é essencial mesmo na manifestação dos falecidos, que para se pronunciarem utilizam-se de cavalos, médiuns ou até, de um simulacro de corpo como é o caso do Baba-Egun[3]. O que a religião diz é: ter corpo é ter um veículo. A religião separa as almas que possuem veículos daquelas que não os possuem, podendo administrar a cessão temporária, ou possessão, entre vivos e mortos.

Ainda de volta aos objetos do corpo, a morte é a perda da identidade comum a eles. As sandálias do falecido, seu chapéu, suas calças folgadas serão dispersos ou desmanchados para compor novas peças. As panelas que a amante de Zorba usava serão carregadas pelos vizinhos, seu colchão acomodará sete crianças de um casebre na rua de baixo, sua dentadura sairá correndo, levada na boca de algum cachorro. A dispersão é a regra para todos os objetos, e, a partir desse fenômeno, também para a personalidade. Esse processo só é amenizado quando sobrevive socialmente o nome, que é o principal objeto simbólico da personalidade, e, em torno de sua memória, são reunidos todos os bens remanescentes (medalhas, registros, etc). Assim se comporão os memoriais que concorrerão com a dispersão histórica.

A partir do falecimento, espera-se que sejam eliminados também os conflitos que o corpo encerra como local de violência, deleite, produção, posse e pertencimento.  Antes de tudo, é preciso eliminar o cadáver para se adquirir a paz derradeira, paz perpétua para os vivos. Infelizmente, o corpo é objeto contaminante da morte e a morte é uma ação reprodutiva[4].  . Mas o desaparecimento do corpo não ocorre sem a transferência dos seus conflitos para o ente espiritual, ou duplo, que ele projetará.

Para começar, pode-se verificar que é o corpo que é castigado no inferno. Os relatos artísticos do inferno (Dante, Bosch e outros) revelam experiências cruéis de torturas físicas, mutilações, vícios, sofrimentos e toda forma de consumição que redundam em castigos corporais[5]. Outras narrações do inferno reputam que ali é, principalmente, o lugar de tortura do corpo para quem encarnou, durante toda a vida, as demandas e respostas do corpo. Quanto mais carnal – voluptuosa, gulosa, luxuriante, irada, preguiçosa etc  – uma existência, maior a tendência a purgá-la no inferno.

Em contraste o desapego conduz ao céu assim como o céu é lugar de desapego. As almas não carregam nada consigo. Aliás, o que são almas? Pura ausência do corpo e dos conflitos do corpo. Para ir ao céu, é preciso ter vivido toda uma vida sem corpo, é preciso ter sido alma (negação, morte) desde o início. Estar no céu é poder usufruir uma vida sem as pressões do corpo e da personalidade. A vida em sociedade nos oprime no sentido inverso, fortificando os simbolismos e a idolatria em torno dessas duas prisões. O que temos ao final? Inconscientemente, corpo e da personalidade são vistos como fardos e livrar-se delas é ir para o céu.

A personalidade é reconhecida pelos objetos que manipula, da forma específica que o faz e como é influenciada por eles. Essa visão, no entanto, pode se apresentar problemática na medida em que se imagina um duplo invisível indo para o céu ou para o inferno, após a morte, desprovido de todo o tecido (material e simbólico) que sempre o abrigou. Persistirá o indivíduo sem a rede de vínculos em que sempre esteve inserido?





[1] Entropia é como se denomina o grau de desordem dos sistemas, principalmente dos sistemas físico-químicos. Segundo as leis da Física, a natureza tem uma tendência para a o maior grau de entropia justamente porque na desordem reside uma maior estabilidade para todas as substâncias e organismos. Freud buscou transferir (Além do Princípio de Prazer) este conceito para a psicologia, explicando uma “pulsão” ou pressão sobre os homens no sentido da morte. Já Morin (O Homem Diante da Morte) coloca a vida, em oposição á morte, como fato extraordinário, uma vez que a existência de seres orgânicos autônomos desafiaria a entropia. A princípio, este último entendimento me levou a crer que teríamos uma curva de ordem-desordem crescente na direção da morte, com o desmanche do organismo, mas reconsiderei essa visão ao perceber que o corpo não converge para uma entropia total, mas se desfaz em novos elementos e substâncias que possuem, por sua vez, formas próprias de organização, às vezes em graus mais requintados.
[2] Refiro-me especialmente ao gradiente cristo-espiritualista brasileiro, que inclui ainda candomblé, umbanda, Kardecismo, Baba-Egun, religiões ameríndias e outras
[3] Representado pelas roupas que encobrem toda uma silhueta onde o espírito deve encarnar ou incorporar
[4] Novamente Morin e Norbert Elias
[5] Ademais, não fizemos o inferno para nós mesmos, mas para o outro.  O inferno é sempre para o vizinho, para o concorrente, para o inimigo e para quem nos trai. E todos esses malditos devem ser castigados no corpo, já que o homem não vê a alma de outro homem. Por isso que no inferno as torturas são de óleo fervente e lâminas afiadas. Mata-se o corpo e acaba-se com o outro.  

Thursday, October 03, 2013

Bolhas

As identidades surgem agregando objetos materiais e imateriais e depois desaparecem, liberando esses objetos para novos vínculos, novas identidades. Vista de uma perspectiva histórica, a existência é um tecido vivo onde aparecem agregações repentinas, movimentando os elementos no seu entorno. O tecido natural está vibrando, pulsando, como água fervente onde as bolhas explodem neste e naquele lugar e depois desaparecem, dando lugar a outras que serão formadas com o mesmo líquido.

Morte e movimento



A morte é a primeira regra, princípio de negação, gerador de movimento. Dela derivam todas as outras condicionantes, sejam físicas, biológicas, religiosas, legais etc. É o evento irreversível que assegura a irreversibilidade de todos os outros eventos. É também o fato que recarrega o mundo, ao mesmo tempo desorganizando e reorganizando as relações entre os seres[1].

Cada falecimento é também um evento de estremecimento na fronteira que separa os vivos dos mortos, daí provocar o medo duplo de que mais vivos morram ou que os mortos voltem. Medo de que a fronteira se rompa, estabelecendo um desequilíbrio, reunindo o que está providencialmente separado. Por mais que a sociedade, no limite, aspire ao convívio com seus falecidos, a convenção geral é o tabu, que inclui não pronunciar o nome, não travar contato com o corpo, destruir completamente e imediatamente o cadáver (cremação, eliminação de pertences) e outras formas de interdição. Essas frágeis normas, que variam de acordo com cada cultura, local etc, e sofrem mutações ao longo dos anos, regulam todas as sociedades e explicam o mesmo estado de defesa.

Para se chegar a uma compreensão da morte no contexto geral das forças da natureza, porém, é preciso reduzir o fato a seus tópicos essenciais. Embora possamos falar em termos entrópicos gerais, inclusive nas leis de conservação e perda de energia, a maneira mais clara de se entender a morte do ponto de vista físico é a da decomposição, ou desfazimento de identidades. Assim, se uma molécula se dissocia em suas formas elementares, morre. Até as menores partículas, se se desagregam, perecem. Nesse passo, podemos ir à relação mínima, formada por um item pontual (campo etc) e seu tempo. Morte é, portanto, dissolução de relações, inclusive de relação com o tempo.

Se observarmos bem, veremos que formas elementares não constituem identidades. Não porque não existam de fato, mas porque só são perceptíveis em associações, por contraposição ou interconexão. Identidades são atribuídas a conjuntos simples ou complexos, a agrupamento de unidades de um mesmo elemento ou de elementos diferentes.


Elemento 1                                                                                                         Elemento 1
                     Unir_____Viver (ter identidade)_____ Morrer-----dispersar
Elemento 2                                                                                                         Elemento 2


De fato, não há vida nem movimento nem força, matéria ou energia que se valha de uma única partícula fundamental. Todo movimento é forjado por um conjunto. Não só os conjuntos participam dos movimentos como geram movimentos expressos em choques, reações químicas, explosões etc.

Desse ponto de vista, os pontos de choque – união/vida e dispersão/morte -, são locais críticos de reconfiguração dos objetos. A morte é um desatar causado por um choque externo ou interno, uma ação qualquer, simples movimento que seja. Mas é movimento, como se algo interceptasse a trajetória do conjunto (que também se move, por isso tem uma trajetória). É um movimento transversal, ou perpendicular, a outro, que ele acaba interrompendo.

A essa sucessão de movimentos descontinuados, chamamos tempo. Nesse caldo, alguns seres são despedaçados, outros são originados com identidades próprias e prosperam. Isso não acontece de forma excepcional, mas é regra tão absoluta (e inescapável, mais do que suporia qualquer lei de probabilidades) no jogo randômico do acaso, que só se pode supor duas coisas: todo equilíbrio é precário e a precariedade é o equilíbrio.

Outro aspecto a ser observado é que as descontinuações favorecem outros movimentos não só porque liberam formas para outros rearranjos, mas também porque criam vácuo no tempo e no espaço para essas novas combinações. É como uma bola de guizos que se choca com a parede e promove o agrupamento dos pequenos objetos em seu interior.

Anterior a tudo isso está a constatação de que continuidade e interrupção são essenciais ao movimento, ou formas de movimento intercomplementares. O universo, assim como o conhecemos, só funciona porque é descontínuo. Como um rio, só corre porque há desníveis no seu leito.




[1] A morte é a reciclagem da natureza. É interessante perceber que a morte também morre quando os cemitérios desaparecem e as gerações que os cultivam perecem e os sentimentos de uma época e as ideias e crenças sobre a morte sucumbem de uma geração para outra. Nada resiste. E também a morte é plena de vida nos charcos metanosos que putrefazem velhas cascas em novos fungos, em terra úmida, em insetos e pequenos pássaros. Do lado dos pântanos, a vida sorri uma boca cheia de limo e vapor e está prenha novamente.

Tuesday, May 21, 2013

Urbex


Penso que o que nos fascina nas ruínas e lugares abandonados é justamente o fato de que eles estão na interface entre a vida e a morte, significando uma brecha no tempo. Explico:

As ruínas não existem para dizer que é possível resisitir ao passar dos anos, mas, ao contrário, para nos mostrar que nada permanece indefinidamente. Elas nos riem as suas bocas banguelas enquanto continuam o seu processo de perecimento lento. São testemunhas do fluxo de horas.

Também estão vivas, porque por elas passam ventos, chuvas e oscilações climáticas, e nelas nascem micróbios, vegetais, pássaros e pequenos roedores, entre outros animais. Esse movimento demonstra que toda a existência brota de coisas aparentemente inanimadas, desde o começo dos tempos.

Mas nada nas ruínas é mais instigante do que a lacuna que percebemos ao circular dentro delas. Sentimos o significado que possuíram na vida das pessoas já falecidas, seja pela grossura das paredes que estas ergueram, seja pelo capricho nos detalhes, no arremate da construção. Notamos que já foram habitadas e, quando encontramos objetos de uso pessoal dos antigos moradores – pias, cômodas, cabides, cadeiras, camas, cadernos e outros - é como se fizéssemos contato com gente de outras épocas. Quanto mais próximos os objetos se encontram na ordem inalterada que esses antigos habitantes do tempo deixaram, mais podemos dizer: "olha, estou aqui, viajei décadas para topar com você no exato ponto em que partiu".

Ainda sobre o alto teor de significância dos objetos pessoais, quanto mais próximos do indivíduo (roupas íntimas, aparelhos de saúde, beleza etc), mais dizem respeito às épocas, culturas, personalidades dos seus donos, ou sejam, mais são humanos.

Ao tempo em que admitimos a morte e não nos horrorizamos diante dela, mas pelo contrário, aprendemos a lidar com todos os seus elementos – falecimento, vida, lacuna – enriquecemos nossa visão sobre o mundo. Os termos "sombrio e enigmático" usado por um site explorador de lugares abandonados (http://www.lugaresesquecidos.com.br), a respeito de uma casa no sul da Espanha, podem ser usados para todas as experiências do tipo, que desafiam a coragem (porque são aventuras próximas do "sombrio"=morte) mas ratificam o valor da vida (como tudo o que é "instigante").

Monday, March 25, 2013

Sonhos


Sonhei que viajava por uma longa estrada cercada de bosques, e cheguei a um povoado onde as pessoas eram feitas de barro, do barro vermelho massapé. Vi duas pessoas, um casal, que talvez fossem duas estátuas, também, e me falavam algo que eu não conseguia ouvir.
Na mesma noite, saí de uma rodoviária e viajei de ônibus até chegar a uma vila. As casas da vila, de um lado e do outro da estrada, tinham os fundos voltados para um rio, ou era mar. Entre as casas e as águas, os moradores faziam os túmulos de seus parentes, cobertos de azulejos e flores.
Noutro dia, eu tinha uma casa na praia, e algumas visitas. Eu pedia silêncio aos vizinhos, e salvava pessoas afogadas num influxo de mar, entre uma duna e a entrada da casa.
Este é o símbolo do signo de Capricórnio. O mais lindo é que ele é formado pela junção de dois animais, a cabra e o peixe. Isso ocorre porque o capricorniano consegue ir aos extremos, tanto no alto (a cabra que sobe montanhas), quanto no fundo (o peixe que habita os abissais do oceano). Essa característica dá a tenacidade própria do nativo deste signo, regido pelo planeta Saturno.

Thursday, February 28, 2013


O indivíduo fora do indivíduo



Numa época de reprodutividade e de registros (vídeos, fotos, arquivos diversos), é possível “ter” as pessoas, em maior ou menor grau, mesmo após o seu falecimento, e essa possibilidade pode impactar as novas relações da sociedade com a morte. Na verdade, a tendência é que a qualidade de registros evolua até presentificar a memória ou mesmo criar dispositivos personificados, a tal ponto que seja viável "conversar" indefinidamente com falecidos.

O contato com a essência informativa de uma pessoa se aproxima cada vez mais do real com computadores que podem pensar, intuir e, em certa medida, sentir.Um computador que reflete como nós, pode nos refletir. Se ele especula conosco, pode nos espelhar. Não seria de estranhar que uma máquina potente, absolutamente esperta, com desempenho garantido por excelentes peças e manutenção, possa manter "presente" o cérebro de um grande líder empresarial, inclusive reproduzindo nuances de sua personalidade, até mesmo suas bravatas, instinto de negócios, compaixão, memória afetiva, humor etc.

A questão não é saber se esse processo se daria tão completamente [1], ou por essa via (novas tecnologias podem surgir). Apresento essa simulação “bizarra” apenas para apontar a presença do individuo fora do indivíduo, algo que já ocorre durante a vida de cada um, em medida ainda muito precária, é verdade.
Há, porém, algo além da limitação tecnológica, que deve ser considerado: a informação que uma pessoa produz e que manipula ainda não são a totalidade do contexto referente ao indivíduo. Além de articular a informação, o homem é ele também, em todos os momentos, fruto de uma conformação, contextualizada no espaço e no tempo.

O desempenho e o comportamento de um indivíduo, mesmo de um animal ou astro sideral, ou galáxia, é apenas a parte mais pobre da informação que está vinculada a qualquer ser. Se o empresário é honesto ou corrupto, se o planeta está agregado a um sistema solar ou se vaga independente, planemo, são apenas contingências que formatam esses objetos. Mas eu pretendo discutir outra questão, que diz respeito a uma identidade mais profunda de cada objeto, a sua origem.

O mais importante é a informação que dá origem a cada ser, e que pode ser descrita como a configuração de uma entropia que resultou no aparecimento de um aglomerado de substâncias.  Na essência, a questão é: como substâncias em movimento e em permanente choque constituíram aquele novo objeto e como, e até quando, esse sistema vai mantê-lo. Trata-se então de referenciar cada existência, como se estabelecêssemos coordenadas para uma curva na história e no espaço que unificou matéria e energia num indivíduo. Reconfigurar essa pessoa é restabelecer essa conjuntura.

O que isso significa, afinal? Que para se obter a mesma identidade somente reproduzindo o mesmo lance do acaso, mesmo encontro de forças, mesma configuração de datas e locais? Possivelmente, mas algo mais além. Se a existência de um indivíduo é engendrada por uma configuração de forças alheias a ele, não existem indivíduos, apenas existem essas forças que se articulam e se rearticulam de diversas maneiras. Não se deve perguntar ao universo onde estão as pessoas e objetos, mas que pessoa ou objeto ele está sendo.

Para cada momento e local, o universo está assumindo identidades várias que se sobrepõem. Mas é a mesma substância que se condensa no jogo de forças, e de choques, e que vai se movendo. Isso, a princípio, pode significar duas coisas distintas: ou não existem identidades (corpos, almas) individuais de pessoas e outros seres, mas apenas uma identidade do universo, manifesta de diferentes formas, ou as diferentes identidades se integram numa só para formar o universo. Ou ainda, ambas as coisas, fluindo e refluindo do maior espectro para o menor.

Uma vez que se percebe que a criação e o fim são exteriores à identidade[2], pode-se dizer que as diferenças de constituição, trajetória e a história de cada elemento seriam absolutamente desimportantes para o universo. No máximo, impactam cadeias imediatas de conseqüências.  A evolução animal, por exemplo, é uma cadeia de conseqüência no que se refere a cada espécie, geração após geração. A sucessão é outra conseqüência imediata em pequena escala, considerando-se indivíduos. A lacuna é até mais importante, como conseqüência indissociável de qualquer perecimento. E o que é lacuna?

Talvez a forma mais radical de lacuna ocorra no universo exterior: nuvens de gases se condensam pela gravidade, explodem e incendeiam na forma de estrelas. Depois queimam todo o seu combustível nuclear, até implodirem pela mesma gravidade. O fim de tudo isso é uma entidade colapsada em si próprio, mas que permanece referência no espaço e no tempo, deformando essas duas grandezas. Não é uma morte de todo o universo, mas de parte dele[3]. As lacunas deixadas pelas mortes de estrelas, assim como aquelas originadas pelo falecimento de indivíduos, merecem ser estudados, pelo seu impacto sobre o remanescente.

Eis porque um computador-simulação não pode ser comparado ao homem que tenta assemelhar, porque são diversos os valores entrópicos originais. Esse computador e esse homem não são apenas dois sujeitos distintos, mas duas manifestações distintas do mesmo universo, dois momentos ou duas “almas” diferentes. Cada um tem a sua trajetória, que envolve dois “acasos” distintos de choques, que dão origem e final próprios a cada um. Basta isso para garantir dois papéis diferentes no universo.



[1] Sobre registros e morte, atentar para novos túmulos em cemitérios que possuem documentários em vídeo, além de páginas na internet para mortos e os chamados cemitérios virtuais ou virtualização dos cemitérios– inclusive com  transmissão ao vivo de funerais.
Não creio que sejam produtos definitivos, nem a solução que deva perdurar, mas podem sinalizar a busca de uma alternativa. De qualquer forma, é preciso entender o caráter do registro, desde a relíquia, o fetichismo, a sacralização, o memorial etc. pode ser também que a abundância do registro (que é feito desde a pintura nas cavernas, passando pelas artes plásticas, fotografia etc) leve a uma banalização da memória. Aí, temos um caminho de via dupla, tanto a banalização do registro dispense a memória afetiva quanto a desnecessidade da memória (ou da saudade) redunde em desprezo pelo registro que sobeja.
[2] Ou seja, você faz o que quer, mas não existe porque quer, nem vai deixar de existir por querer....
[3] Como o tempo é deformado, ousaria dizer que a estrela dentro de um buraco negro pode voltar a brilhar na conjuntura (espaço-tempo) em que sempre existiu, realizando uma volta ao seu período de esplendor, num tempo todo seu. 

Monday, February 18, 2013

O que há no espaço vazio?

O que há no espaço vazio? Espaço. Mas o espaço vazio é instável, e ele “racha”, atraindo substância (energia) que se condensa como matéria em diversas formas. Ou seja, o espaço cria um campo propício à condensação de energia. 

A matéria e a energia escura são o resultado de uma migração de gravitóns através das camadas de tempo. Essa hipótese tenta um arranjo a partir da teoria das cordas. Ao invés de entendermos outras dimensões como dimensões “enroladas” ou minúsculas, onde as cordas vibram e a gravidade escapa, podemos conceber que estas manifestações ocorrem em outras dimensões, ou desdobramentos temporais. Assim podemos chamá-las de energia ou matéria fantasmas, não porque não existam, mas porque são estruturas que migram através do tempo. Como num fluxo de um rio, uma gota d'água que ficou para trás pode ser arremessada e jogada mais à frente, impactando o fluxo numa posição mais adiante. O objeto que provocou o graviton (massa de estrela, plasma de elétrons) já não estará mais lá, mas o gráviton reaparece. Neste sentido, como em muitos outros, o bóson de Higs e os buracos negros podem ter muito em comum. Eles não estariam obrigados a compor elementos em um padrão sincrônico (um só tempo, atual), mas podem atuar diacronicamente (em camadas de tempo diversas).


Monday, January 21, 2013

A Casapássara

By: Nestor

Porque esta página se chama Casapássara



O nome Casapássara me apareceu automaticamente ao ler esta maravilhosa história, em 2001 (Revista Totem, Nº 4, de 6/1980, Edizioni Nuova Frontiera, Roma)

Wednesday, January 16, 2013

Festa de Santa Bárbara, Salvador (BA), 2007

Natal de 2011, Salvador-BA

Quererá

Povoado do Quererá (Araci/Tucano-BA), em novembro de 2012

Encontro


Para encontrar respostas, procure-as na natureza, nas dobras da natureza, em seus socavões, explosões, erupções, choques, erosões, corrosões, desmoronamentos, mortes, fecundações e nascimentos. Nas ondas e órbitas. E na vida, que germina em todos os lugares, nos cantos mais escuros. Depois, perscrute o mistério, o impossível e o inexplicável, que abundam nas leis mais rígidas e em todas as camadas do tempo. Por último, persiga a intuição, as deduções, os devaneios e as coincidências de interpretação que jazem nas artes, nas religiões e nos instintos dos que vivem. Como eles traduzem a experiência? O que há de comum em todas as vozes do mundo? Há verdades tão antigas que o silêncio, sendo cego, pode vê-las quando sonha.