Tuesday, September 23, 2014

Carta ao professor Fábio, de Física

Prezado Fábio,




Bem sabe que eu não sou um acadêmico, nem mesmo um interlocutor muito qualificado para fazer proposições no terreno da ciência. No entanto, recorrendo à intuição (que me diz que a observação muito próxima pode, algumas vezes, prejudicar o foco sobre as coisas), atrevo-me, justamente por olhar de longe, a fazer as seguintes ponderações sobre energia e matéria escuras:
a)      O modelo padrão cosmológico permitiu que algumas correntes considerassem a possibilidade de “dimensões enroladas”, primeiro porque isso permitiria a consecução de uma teoria unificada das quatro forças conhecidas. Além disso, tais “dimensões” permitiriam explicar certa descompensação da gravidade, que parece “escapar” deste universo. Neste mesmo sentido, perduram diversas indagações sobre os buracos negros e sua relação com o big bang (criação-destruição);
b)      Por outro lado, a proposição da energia e da matéria escuras nos sinaliza forças épicas e não-identificadas, também de origem desconhecida, atuando de forma inegável sobre a movimentação dos grandes conjuntos estelares;
c)       Nesse passo, de uma força que some e outras que aparecem, restou-me perguntar: a gravidade perdida e a energia escura não seriam a mesma substância que escapa de algum momento anterior ou futuro? Não seriam as “dimensões enroladas” uma dimensão só, o tempo, que se amolda ao fluxo cósmico, e conduz este fluxo, em performances ainda não calculadas – para além da simples dilatação da relatividade? Esses desdobramentos – perda e permanência - do tempo poderiam explicar os intervalos quânticos ou mesmo ter impacto sobre as teorias da expansão e das cordas?
d)      Já que tem sido usual na crônica cientifica mais popularesca – e eu, como jornalista, acabo almoçando nesse andar térreo – usar sempre uma metáfora ou desenho para explicar conjecturas diversas, proponho uma aqui que mais serve para que eu visualize o absurdo que propus do que para justificá-lo aos seus olhos.  Imaginemos uma bordadeira que, com a ajuda de uma agulha, faz uma linha atravessar o tecido diversas vezes ate obter uma figura qualquer. Suponho, então, que até hoje vivemos na superfície do bordado, vendo aparecerem pontos dia após dia, sem conceber a continuidade entre eles. Bom exemplo poderia ser o elétron, que some e depois aparece numa órbita mais carregada, e não sabemos onde esteve no período, nem mesmo se frequentou um "subsolo" temporal.
e)      Seria o caso, portanto, de se considerar um modelo transcendente – que esta palavra esteja despida de todo misticismo -, não mais levando em conta dimensões mínimas na escala de Plank, mas tomando o conjunto energético universal através dos tempos.

f)       No item “C”, fiz questão de demarcar a possibilidade de uma corrente de força gravitacional vinda do futuro, o que é apenas uma hipótese absurda dentro de uma proposição mais absurda ainda. Mas, já que estamos neste conjecturar, por que não considerarmos que até mesmo as leis de causalidade, do fluxo unidirecional do tempo, podem ser revistas, obtendo-se uma configuração mais plasmática da corrente temporal e seus desdobramentos?  

Agradeço pela paciência,

Franklin

 

A morte líquida

Quando uma pessoa morre, todos os elementos que a compõem permanecem vivos, se recombinando em novos organismos. O que se perde não é a vida, mas a identidade, o nome. Renunciemos a ele. Creio na alma também, mas, por comparação, pode acontecer a ela a mesma coisa, diluir-se no caldeirão da matéria que lhe é assemelhada.