Tuesday, January 20, 2015

Expressões artísticas de cunho popular em cemitérios brasileiros



A professora Maria Elizia Borges Brasil, da Universidade Federal de Goiás, deu uma contribuição significativa à compreensão da carga simbólica relativa à morte no Brasil com seu artigo "Expressiones Artísticas de Cuño Popular em Cementerios Brasileños", disponível na internet. Iniciando com uma abordagem mais geral sobre a arte cemiterial e o luto burguês, que envolvem altos investimentos e padrões artísticos mais tradicionais, Maria Elizia aprofunda o debate sobre expressões decorativas de sepulturas populares, cuja tônica é o improviso conduzido pelos familiares dos falecidos.
Mais do que isso, a professora detecta que os familiares empregam neste improviso, muitas vezes, materiais que sobram de obras em suas residências (azulejos e tintas etc), ou aquilo mais que aflorar do cotidiano doméstico, como flores de plástico, embalagens recicladas (vidros de café solúvel etc), vasos de cerâmica ou porcelana, e até mesmo lembranças de viagens, como miniaturas e animais de louça e de pelúcia. Também aplicam mão de obra menos qualificada: ao invés de escultores, tratam diretamente com pedreiros e artesãos. Isso tudo pode ser reconhecido nos nichos de sepulturas, muitas das quais têm formato de pequenas capelas/casas, e em ossuários.
A autora também reconhece nesta montagem uma forma de os familiares elaborarem seu luto e se reconhecerem na relação com o falecido. "A participação familiar na feitura do túmulo é uma das maneiras através das quais comprovamos a necessidade sentida pela família de elaborar melhor a perda do ser querido. As pessoas necessitam de aproximar-se dos túmulos, criar um ambiente íntimo e de recolhimento, para que possam exercitar o ato de devoção, fazer-lhes visitas e embelezá-los com flores" [tradução nossa].
Outros dois aspectos nos chamam a atenção: um deles, mencionado pela autora, é a renovação periódica destes ambientes, principalmente nos dias de finados. De nossa parte, salientamos que, em alguns casos, a construção da sepultura pode levar tempo, seja porque a família precisa contratar os serviços de pedreiros, encomendar lápides, transportar materiais etc, seja porque o funeral gerou despesas que precisam ser superadas pelo orçamento familiar antes da formatação da sepultura – o que, em alguma escala, sempre demanda recursos. Esse tempo de espera também se integra, acreditamos, ao ritual de elaboração do luto citado pela professora.