Wednesday, March 26, 2014

Alcântara

Alcântara é uma cidade coberta de nuvens e penumbras, mesmo em dias de sol. É feita de um silêncio ruim para quem tem medo, porque nada muda, meses a fio. O chão é calçado com pedras de ferro, o céu é de chumbo, o mar é envenenado pelo mangue e respiramos o mesmo ar que os mortos ainda respiram, eles escondidos por trás das ruínas dos casarões. E os casarões enormes, onde moram famílias pobres, formam um cemitério, a capital do silêncio.

O silêncio permanece, dia após dia. De repente, fica tudo em suspenso e sobrevém o vazio. Quando menos se espera, surge de novo o silêncio e o tempo então para. O futuro tenta aparecer, vindo no vento, mas o silêncio vigia nas pedras altas das ruínas e logo avança como um gavião que rasga-lhe as asas, sangrando o futuro. A noite é sempre pesada, com um calor esmagador, e os dias, embora lindos dias de bananeiras e mangueiras e quintais exuberantes, são imutáveis como pinturas tropicais. Tudo segredo, tudo mistério, tudo mentira. 

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