Sunday, July 03, 2022

Três axiomas da morte

  1.  O contato com a morte é experiência existencial de insegurança dos limites do evento — Diante da perda de alguém sentimos degenerar nosso grau de relação com a realidade, porque o contato com a pessoa ora extinta era uma forma de mediação com o mundo, com a família, a cidade, a vizinhança etc. O fim de um conhecido é também o perecimento de uma fração das nossas vidas, e gera dúvidas sobre a continuidade de parte ou mesmo da totalidade da nossa existência.  
  2.  Toda experiência de morte circunscreve-se na vida e por ela é moldada e a ela está restrita, mesmo os túmulos, o além, crenças e teorias sobre o assunto — Os vivos podem sentir muitas vezes o falecimento de alguém, mas os mortos não morrem outras vezes, nem sofrem, nem dividem conosco as apreensões e inquietações pelo fenômeno da sua extinção. Suas circunstâncias são outras. Nós, os vivos, estamos solitários tentando criar ferramentas e ritos que nos faça ver um sentido para as coisas. 
  3. A ideia de morte é ferramenta de domínio, criação, regulação, cura etc também manipulada como estereótipo em diversas performances — Como as palavras enfileiradas até aqui (insegurança, dúvidas, apreensões e inquietações) remetem a mistério, é natural esperarmos que haja uma ampla condição de amedrontamento do homem comum diante daquilo e daquele que está familiarizado com a morte, como líderes religiosos, médicos e lideranças políticas capazes de manipular paranoias de aniquilação. Da mesma forma, medo de todas as lendas, mitos e imagens da morte.

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